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Pois é, Deborah…

Se em 47 a. C. o general e cônsul romano Júlio César veio,
viu e venceu, neste 40º Fenata a atriz, diretora e produtora gaúcha Deborah Finocchiaro
veio, viu, foi vista e acachapou. E iluminou. E apontou caminhos. E ensinou. E mostrou
de forma absolutamente competente como é o ofício de atriz/ator. E demonstrou,
com uma humildade que só poderia vir de alguém que ama o teatro e a vida como a
si mesma, que a generosidade é o melhor caminho neste mundo complexo, perigoso,
arisco e salpicado de mentes politicamente corretas (essa ignomínia que desejamos
ardentemente a zilhões de anos-luz de distância do teatro).

Em suma, é o que se viu na noite desta segunda-feira (12),
no auditório A do Cine-Teatro Ópera, com o espetáculo Pois é, Vizinha…, da Companhia
de Solos & Bem Acompanhados, de Porto Alegre (RS), apresentado mais de 560 vezes e visto por mais de 200 mil pessoas,
em 19 anos de estrada. A partir do texto original, Uma Donna Sola, do
dramaturgo, ator e diretor italiano Dario Fo e de Franca Rame, e traduzido pelo
diretor paulista Roberto Vignati, Deborah fez uma adaptação para os dias atuais
de um tema irritantemente recorrente: a violência contra a mulher. Segundo a
sinopse da peça, trata-se da história de Maria, uma dona de casa trancafiada
em casa pelo marido ‘gauchão’ e que é obrigada a suportar o cunhado
semiparalítico e tarado, o ‘voyeur’ do prédio vizinho, o tarado do telefone e o
apaixonado rapaz, que é professor de inglês. Tudo isso, ao mesmo tempo em que
ela tem de cuidar do bebê.

Certo dia, enquanto varre a varanda do apartamento, Maria encontra
uma vizinha do prédio em frente e começa a desabafar. Aos poucos, seu ‘simples
cotidiano’ começa a se revelar patético e… cruel. Tanto que a plateia demora um
pouco para perceber que, na verdade, está rindo – e às vezes gargalhando – de algo
trágico. E, quando se dá conta, já é tarde, e o riso frouxo se torna algo asfixiante.
O engasgo e o engolir seco não demoram a chegar, e público começa a rir, então,
da miséria humana; da sua própria miséria. A montagem causa um conjunto tão grande
de sensações que é de perder o fôlego
quando Deborah resvala no escatológico sexual e, por vezes, no caricatural.

Como é bom ver Deborah em cena. Como é bom ver uma atriz na
sua plenitude, com um trabalho em tudo diferente daquele poético Sobre anjos & grilos – o universo de
Mário Quintana, apresentado em 2007, durante o 35º Fenata. E exatamente em
tudo competente, na mesma toada.

Deborah está soberba
em cena, dona absoluta do tempo e do espaço do espetáculo. Vai do gesto mais
ínfimo da pontinha do dedo mindinho aos movimentos mais amplos de quando
encena, por exemplo, a hilária ‘comparação’ do orgasmo feminino. Se alguém
tinha alguma dúvida de que também se aprende em festivais, isso acabou na noite
de segunda.

Pois é, Deborah. Decididamente,
você deu uma aula de teatro e de vida. Obrigado pela sua generosidade.

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