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16 anos da Lei Maria da Penha: entenda o significado e a importância da lei

Foto: Divulgação

Este mês de agosto é marcado por comemorar os 16 anos da Lei Maria da Penha,  que foi um marco muito importante por adicionar a qualificadora de “violência doméstica” nos crimes de lesões corporais, previstos no Código Penal.

É importante entendermos que a Lei Maria da Penha não criou um crime de violência doméstica, mas ela impulsionou a inclusão no CP de um patamar de pena mais rígido nos casos de lesões corporais qualificadas por violência doméstica.

Além disso, foi propulsora dos juizados especializados de violência doméstica contra a mulher e proibiu, em casos de violência doméstica, a sanção pecuniária. Institui as medidas protetivas, e especificou as formas que podem se dar a violência contra mulher (física, psicológica, patrimonial, sexual e moral).

Por fim, a lei inovou no sentido de trazer medidas integradas de prevenção, como campanhas educativas.

Nos últimos anos, a temática da violência doméstica recebeu muito mais atenção do que em qualquer outro momento, bem como as questões relacionadas a esse objeto, tais como: a assistência à mulher em situação de violência doméstica; as medidas de prevenção e atendimento da mulher pelas autoridades policiais; a competência do julgamento de casos que envolvam essa matéria; e as medidas protetivas de urgência e a criminalização dessas condutas.

Neste cenário, a implementação da Lei Maria da Penha – fruto de um mandado de criminalização determinado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos – foi um marco importante no fortalecimento da proteção das mulheres vítimas de violência doméstica e familiar.

Em abril deste ano, nós também tivemos uma decisão importante do Superior Tribunal de Justiça (STJ) para a aplicação da Lei Maria da Penha para mulheres trans. Essa decisão foi muito simbólica porque a mulher trans é oprimida, não só pelo fato de ser mulher, mas pelo fato de ser trans também, logo, ela é duplamente oprimida e precisamos de uma maior proteção.

A realidade antes da Lei

Antes da Lei Maria da Penha começar a ser aplicada, um dos maiores problemas a serem enfrentados era o fato de se trabalhar com uma circunstância que não se traduzia em uma figura penal. Por conta disso, muitas vezes era necessário convencer a própria vítima de que os comportamentos violentos dos agressores deveriam ser punidos.

Com o passar do tempo, a violência doméstica contra a mulher passou a ser amparada pela Lei 9099/95 que regula crimes de menor potencial ofensivo, os quais são julgados pelos JECRIM – juizado especial criminal.

O aspecto positivo foi que a sociedade passou a ter um maior entendimento de que a violência doméstica contra mulher é crime. No entanto, por se tratar de crimes de menor potencial ofensivo, a punição era muito branda e quase sempre a pena do agressor era convertida em prestação de serviços à comunidade.

As mudanças na Lei

Uma mudança importante que temos que falar no espectro da violência doméstica é que   até 2021 a violência psicológica contra a mulher estava apenas prevista no artigo 7 da Lei n. 11.340/2006 como uma forma de violência doméstica. Todavia, não era crime, o que dificultava a imposição de medidas protetivas previstas no dispositivo legal.

Ainda, até então, as mulheres que sofriam de abuso emocional e diminuição de autoestima causadas por agressores, motivados a afirmar superioridade de gênero, acreditavam que essas condutas não eram tão reprováveis e que muitas vezes faziam parte dos relacionamentos. Ocorre que, em 2021, o legislador criminalizou a violência psicológica contra mulher, com o artigo 147-B do Código Penal, atrelando a essa conduta à pena de 6 meses a 2 anos e multa. 

Pode-se perceber que, com menos de um ano de implementação deste tipo penal, as pessoas já falam sobre isso, as mulheres se percebem mais em relações abusivas e situações as quais não devemos tolerar. Logo, não foi uma mudança na lei Maria da Penha, mas a consolidação de uma nova lei com intuito de garantir a efetividade da lei Maria da Penha.

A realidade atual da violência doméstica no Brasil

É inegável que o direito, por meio da coerção, é um importante aliado no combate à violência doméstica e o seu poder não deve ser negligenciado. Todavia, quando o Direito Penal faz uso do poder coercitivo, temos um cenário de individualizações de responsabilização. Fato este que, muitas vezes, é urgente e necessário quando falamos de violência doméstica.

No entanto, o uso indiscriminado do poder coercitivo nos traz alguns alertas. O primeiro é a preocupação voltada à redução de demandas coletivas em individuais, com objetivo de criar uma política estatal para o combate da violência de gênero, voltada somente para o punitivismo.

A problemática que norteia essa premissa é que se consolida uma falsa visão de que a resolução do problema está na prisão de “x”, “y” ou “z” e não nos questionamentos da socialização patriarcal. Já em segundo lugar, é importante lembrar que o próprio direito surge como uma ferramenta para a manutenção da lógica patriarcal.

Sendo assim, o uso do seu poder coercitivo acaba sendo incoerente e, no caso da violência doméstica, corroborando para os estereótipos de gênero. Portanto, estamos diante de uma situação paradoxal onde a coerção é um elemento importante e essencial para evitar, em matéria de urgência, que os números desastrosos de violência doméstica continuam a aumentar e, ao mesmo tempo, também é um elemento que ajuda a consolidar a lógica que está por trás desta barbárie.

*Mayra Cardozo, advogada especialista em Direitos Humanos e Penal, também é mentora de Feminismo e Inclusão e líder de empoderamento.

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