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Advogado criminalista de PG faria 100 anos nesta quarta

Arquivo da família
Mário Jorge na formatura da Turma Rui Barbosa UFPR 1950

Nascido em São Paulo, em 11 de janeiro de 1917, o advogado Mário Jorge completaria hoje 100 anos de vida. Fixou-se com seus pais e irmãos em Ponta Grossa, onde cursou o primário e depois o Ginásio Regente Feijó. Dada a relevância dos serviços prestados à sociedade, seu nome foi dado a ruas das cidades de Ponta Grossa, Curitiba e São José dos Pinhais.

Dois fatos da juventude marcaram sua vida e comportamento profissional. O primeiro, com cerca de 6 anos de idade, quando assistiu seu pai, pequeno comerciante, chorando porque um advogado, a mando judicial, retirava todas as mercadorias da prateleira. Mário Jorge, assustado, teria apanhado um metro de medir tecidos e começou a bater no advogado.

O segundo episódio, quando Mário Jorge tinha seus 20 anos de idade e ao passar por um bar, em Ponta Grossa, assistiu dois homens discutindo e um deles disse: “Por que não me expulsa outra vez do Paraná?”, quando um policial interveio querendo prender aquele que estava armado e o outro se limitou a dizer: “Não prenda, eu resolvo isso de outra forma.” Era novembro de 1937 e persistia a ditadura. Os dois eram: o Interventor Federal do Estado, Sr. Manoel Ribas e Miguel Quadros, um dos mais conceituados advogados do Paraná e tio do ex-presidente da República Dr. Jânio Quadros. Mais tarde, ele soube que um daqueles rixentos tinha sido assassinado: o advogado.

O autor do crime teria sido visto quando atirou pela fresta existente entre o muro e a casa da vítima. Segundo testemunhas, aparentava ser jovem não mais que 30 anos. A polícia teria extorquido a confissão do “seresteiro” João Ferreira Guimarães Barbosa, mais conhecido como Barbosa Paraná, com 60 anos de idade que mal a ninguém fazia. Preso e submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri de Ponta Grossa, os advogados temerosos, recusaram a defesa.

O Advogado Edwi Villacqua, curioso, olhou porta adentro do plenário e o Juiz Joaquim Meneleu de Almeida Torres determinou que ocupasse a tribuna e fizesse a defesa. Improvisou dizendo: “Todos sabem que este homem é inocente, quem tiver coragem de absolver, que absolva.” Absolvido por unanimidade de votos. A acusação interpôs recurso ao então Tribunal de Apelação. A decisão do júri foi reformada e  o réu condenado à pena de  21 anos de reclusão. Consumava-se o erro judiciário.

O fato ficou conhecido como o “Caso Barbosa Paraná”. Todos sabiam da inocência do condenado. Por curiosidade, Mário Jorge, que era auxiliar de mecânico da Oficina Internacional de Ponta Grossa, resolveu visitá-lo na penitenciária, ouvindo suas queixas, a truculência de que fora vítima e as juras de inocência do sentenciado. Prometeu que iria procurar um advogado. Ninguém se interessou pelo caso. Ao voltar ao presídio ouviu do condenado já idoso: “Não se preocupe moço, já me conformei em morrer aqui.”

Mário Jorge jurou que iria cursar Direito e ele mesmo provaria a inocência de Barbosa Paraná. E assim o fez. Ingressou na Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paraná e ainda acadêmico passou a correr atrás das provas. Nessa época passou a prestar serviços ao Jornal Diário dos Campos, sob a direção de José Hoffmann.

Anos depois, Mário Jorge recebeu uma carta de Noel Nascimento, Promotor de Justiça em Guarapuava, que o chamava de visionário correndo atrás de provas de inocência. Na correspondência narrava que determinado cidadão, no leito de morte, não queira partir sem antes fazer uma confissão perante as autoridades da comarca. Tinha sido o autor do delito, por questões de terras. Crime prescrito.

Caso do Filho do Carteiro – Mário Jorge pegou gosto pela advocacia. Onde se vislumbrava a possibilidade de uma injustiça, dedicava o máximo de esforço à busca de provas de inocência.  Em 1964 outro erro judiciário ocorreu em Ponta Grossa, levando três jovens amigos, Januário, Luiz e Francisco à condenação de pena de 26, 22 e 28 anos de reclusão por latrocínio, que não cometeram. A vítima era motorista de taxi e no interior do carro teria sido encontrado um bilhete cuja grafia o Instituto de Criminalística do Paraná atribuiu a um dos acusados. O pai de um deles era carteiro e escreveu ao programa radiofônico criado e dirigido por Mário Jorge “Culpado ou Inocente?” pedindo ajuda. O advogado angariou provas, submeteu à nova perícia o bilhete. O primeiro perito concluiu que a grafia não pertencia a nenhum dos acusados. O outro foi além afirmando conclusivamente que a letra era de uma das testemunhas de acusação. O formalismo das Cortes falou mais alto que o brado de inocência dos condenados. O Advogado fizera a sua parte. Ainda assim, extraíra o máximo dos benefícios ofertados pela lei penal e sendo primários e sem antecedentes, foram colocados em liberdade condicional para o cumprimento do restante da pena.

 

O caso da professorinha – Em 1969, na cidade de Papanduva/SC uma professora, M.N.S., foi acusada de bater as cabeças de dois alunos, matando um deles e ferindo gravemente a outro. A imprensa se encarregou de acirrar o clamor público e muitos queriam linchar a professora. Era jovem, pobre, que andava 6 quilômetros por dia a pé para lecionar. Mário Jorge de passagem pela cidade resolveu examinar o processo e inteirar-se dos fatos. A professora havia sido sumariamente demitida. Em poucos dias, o Defensor comprovou cientificamente através de autopsia que requereu, que os ferimentos apontados em raio X como sendo fraturas de crânio, nada mais eram do que câncer corroendo os ossos da cabeça do menino e formando estrias. Foi absolvida em tempo recorde. Como ato de desagravo o Governo do Estado de Santa Catarina através da Secretaria de Educação a reconduziu às atividades imediatamente.  Recebeu do Estado bolsa de estudos logrando formar-se no Magistério, sendo ela oradora da turma e Mário Jorge, o Paraninfo.

 

O caso do quilo de carne –Uma senhora carente A. N. D., que vivia com os filhos menores embaixo da ponte do Rio Marrecas, em Francisco Beltrão, foi condenada  à pena de 3 anos e 6 meses de reclusão por haver recebido um quilo de carne de porco que consumiu com os filhos e que teria sido furtado. Ao ser encaminhada à penitenciária feminina, o fato ganhou manchete nacional, pelo rigorismo da pena imposta. Em poucos dias, Mário Jorge obteve do Tribunal de Alçada seu alvará de soltura. Em liberdade, mudou-se para o município de Mandirituba, obtendo auxílio para moradia, estudos para os filhos e emprego digno. Mais tarde, em homenagem, uma das escolas passou a chamar-se Escola Municipal Dr. Mário Jorge.

 

Justiceiro

Mário Jorge foi o responsável pela resolução de inúmeros outros casos de reparação de injustiça. Marcou época na Advocacia Criminal. Criou o Instituto Brasileiro de Revisões Criminais com a finalidade de revisar gratuitamente os processos de réus inocentes, condenados sem assistência de defensor constituído. Tido como defensor dos pobres, foi considerado o maior homem do Júri do Brasil. Participou de nada menos que 1,5 mil júris. Nunca se calou diante da prepotência, do abuso de poder, do abuso de autoridade. Faleceu em 1º de junho de 1987. (Texto de Terezinha Elinei de Oliveira, advogada – OAB/PR 6455).

 

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