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Resistência bacteriana reduz opções de tratamento e ameaça a saúde global

Ao reduzir o arsenal médico para tratar infecções graves, a resistência bacteriana representa uma das principais ameaças à saúde global, com impactos sociais, econômicos e ambientais. Estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam que, a partir de 2050, mais de 10 milhões de pessoas morrerão por ano por causa de bactérias resistentes a antibióticos, superando o número anual de óbitos por câncer, que hoje chega a 8,2 milhões.

“A resistência microbiana representa hoje um dos principais desafios nas áreas epidemiológica e terapêutica de infecções para várias especialidades médicas no Brasil e no mundo”, afirma a médica Flávia Rossi, diretora médica do Serviço de Microbiologia da Divisão do Laboratório Central do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP).

A resistência bacteriana aumenta o tempo de permanência dos pacientes em hospitais, demanda a realização de uma quantidade maior de exames médicos, eleva os preços dos tratamentos, além de contribuir para o aumento da mortalidade. “As taxas de resistência das bactérias gram-negativas tomaram uma proporção muito alta, sobretudo nas infecções por Enterobactérias, em especial as relacionadas à Klebsiella pneumoniae. Essas bactérias adquiriram enzimas que destroem os principais antibióticos utilizados atualmente, como os carbapenêmicos, e dificultam o tratamento das infecções”, destaca a infectologista.

As discussões em torno do problema se intensificaram no Brasil desde 2010, quando dezenas de pessoas morreram após surtos da bactéria multirresistente Klebsiella pneumoniae produtora de carbapenemase (KPC). Os dados mais recentes da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) apontam que, ainda em 2015, a Klebsiella pneumoniae era a bactéria mais notificada como causadora de infecção por corrente sanguínea em adultos hospitalizados nas unidades de terapia intensiva (UTIs) do país, representando 16,9% dos casos.

No ano passado, novos surtos de KPC foram registrados em diferentes Estados, entre eles São Paulo, Santa Catarina, Mato Grosso e Bahia. “O primeiro caso de KPC no país ocorreu em 2005, no Recife, e observamos, desde 2009 e 2010, um grande aumento no número de casos, especialmente em locais como São Paulo, Distrito Federal e Minas Gerais. Vale lembrar que toda a população está exposta aos riscos, não apenas o paciente em ambiente hospitalar, especialmente por conta do descarte impróprio de esgoto nos rios”, destaca a médica.

Estratégia integrada

A infectologista Flávia Rossi, que integra o Advisory Group on Integrated Surveillance of Antimicrobial (Grupo de Vigilância Integrada de Resistência Microbiana) da OMS, reforça a importância de se considerar o impacto das questões ambientais no combate ao problema. “Assim como é preciso controlar o uso de antibióticos nos pacientes dentro e fora dos hospitais, são necessários um diagnóstico microbiológico rápido e um controle na utilização de antibióticos na criação de animais. Tudo isso precisa estar associado a ações de saneamento básico e manejo de esgoto. Esse olhar integral da saúde é fundamental para avançar no enfrentamento do problema”, esclarece. 

Um estudo apresentado neste ano durante o XX Congresso Brasileiro de Infectologia reforça a importância de novas estratégias de combate à KPC no País. Foram analisadas 860 amostras da bactéria Klebsiella pneumoniae colhidas em sete hospitais do Rio de Janeiro, entre os anos de 2015 e 2017. Em 232 das amostras, mais de um quarto do total, foram encontradas bactérias produtoras de carbapenemase, enzima que confere resistência a esses microrganismos. Além disso, 61 também eram resistentes à colistina, um antibiótico utilizado para infecções graves relacionadas às bactérias que produzem carbapenemase. 

Um outro estudo científico, envolvendo 3085 amostras de Klebsiella pneumoniae de pacientes de dez hospitais privados da Grande São Paulo, aponta que a resistência entre esses micro-organismos tem se mostrado mais frequente nos últimos anos. O trabalho, que analisou amostras de 2011 a 2015, aponta que a resistência relacionada à enzima carbapenemase subiu de 6,8% para 35,5% no período investigado.

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