em

Araucária – Patrimônio jurássico

Divulgação

O brasão da cidade de Ponta Grossa ostenta a araucária como um dos seus símbolos

Árvore símbolo do Paraná, do sul do Brasil, Pinheiro-do-Paraná. Elevou-se, foi buscar no anil o toque divino. Posicionou-se ereta, almejando o céu, para nós, sobranceira em proteção pujante.

Não é de hoje que este ser de porte nobre impressiona, na uniformidade da paisagem dos planaltos a recorrência que nutre os olhos. Quanto mais indivíduos reunidos, maior a altivez que cada um, magnificamente, adiciona ao conjunto. Ocorrência exclusiva do hemisfério sul, beleza que não visita outras paragens. Pousa e se fixa na paisagem, não é peregrina, nem andarilha, é senhora complacente de sua missão.

Por que o símbolo quase se extirpou? Não a si mesmo, mas pelas mãos predatórias que não conhecem a sustentabilidade. Mãos que não merecem a sustentação como indivíduo. Vidas que, na subsistência incógnita, lançam mão do que sustenta.

Na paisagem inexplorada de poucas décadas atrás, as araucárias cobriam, como tapete, o vasto território virginal. Tão abundante, parecia não ter fim. Madeira rica, matéria fértil em propriedades sem fim. O que falta a nós? Falta-nos a voz que sussurra o limite? Fala a voz que insiste, alude e regride. Não deixa assolar em desolação. Olhos que se voltaram para a progressão material, cerraram-se para os exemplares altivos. Tronco forte, da casca marrom-arroxeada foi ao chão em promessa econômica.

Curiosa espécie, como nós, possui indivíduos machos e indivíduos fêmeas, complementares no papel de geração e perpetuação da espécie. Gênero exigente, exibe na longevidade a relação ancestral com o tempo. Nossos tempos de pressa avassaladora não permitem esperar, destes, os anos requeridos para a fase adulta. Ironicamente, embora símbolo, tão preteridas quando da escolha para reflorestamento. Nossas atitudes com o nobre reino vegetal nos extinguem? Sim, antagonismo irracional, ao mesmo tempo em que ansiamos vorazmente pela abundância material, os passos gananciosos convergem para a exaustão, escassez e aridez dos recursos.

Nosso altivo símbolo hoje é classificado como em perigo crítico de extinção. Intrigante perceber que este ser jurássico, sim, remonta a 200 milhões de anos, foi vertiginosamente abatido apenas nos últimos 50 anos. Milhões em calmaria foram arregimentados para míseras décadas em degradação.

Na forma escultural da araucária, uma alusão ao candelabro, imagem para um símbolo arquetípico de reza, de elevação dos pensamentos aos mais altos dos céus em prece. Ela reza por nós? Creio que sim, acalenta os olhos mergulhá-los nos candelabros acesos, que rogam por nós.

Tão útil que de sua madeira se pode produzir de palito de fósforo a mastro de navio. Como resistir à prontidão servil do altivo ser? Quem dera gritasse, esperneasse ante as rudezas que as põem abaixo! Mas, em vez disso, apenas o silêncio, imóvel, impassível, a realeza que mesmo quando condenada à morte segue até o algoz em passos soberanos. Símbolo do Paraná? O que esperamos de um símbolo? Almejamos do símbolo a postura nobre, ou carregamos, através dele, nossas próprias condenações?

Como no furor da época da revolução francesa, os ânimos andam inflamados, qualquer mínimo desagravo torna um amigo, inimigo e faz de um confidente em estranho. O que esperar de quem nos representa? Sendo esta embaixatriz de origem vegetal, teria, a araucária, a habilidade política requerida para nos representar? Penso que sim. Jamais se exasperaria, jamais levantaria a voz ou os braços (em candelabro aceso) contra quem quer que fosse. Em meio a tanta insanidade, quem se mantém plácido e irrepreensível, conquista o direito, por justo merecimento, de ser símbolo.

*A autora é escritora, integrante da Academia de Letras dos Campos Gerais e da Academia Ponta-grossense de Letras e Artes.

 

Participe do grupo e receba as principais notícias da sua região na palma da sua mão.

Entre no grupo Ao entrar você está ciente e de acordo com os termos de uso e privacidade do WhatsApp.