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Cartão-postal

Acervo de Cássio Murilo

Cartão-postal de Ponta Grossa do ano de 1946

Na mente sempre uma lembrança, mesmo a infância, tão pouco perene, carrega na memória, imagem tênue, fresca recorrência. Décadas atrás, afluíam nos correios imensos volumes de postais, cartões-postais vindos de todos os lugares do mundo, incluindo a própria cidade do destinatário, levando pedaços de paisagens, locais e monumentos às mentes mais interessadas e às mais desavisadas. Coleções completas como os arenitos do Parque Vila Velha. A “taça” vista sob diferentes olhares, no ângulo mais privilegiado, a procura de um instante inusitado. Uma curitibana contou que, em sua primeira viagem à Ponta Grossa, ainda na adolescência, fez questão de enviar postais aos familiares assim que desceu na Princesa dos Campos. Os postais chegaram ao destino muito depois, ainda assim, o afã pelo registro impregnou as imagens na lembrança.

Criado no século XIX, o cartão-postal ou bilhete-postal chegou ao Brasil em 1880, através do Decreto nº 7695. O que mais impressiona os olhos, a paisagem ou a consagração pelo apoderar-se das cenas? Falar de cartões-postais é evocar a nostalgia? Da prática em desuso o que a tecnologia resguardaria? Um retângulo com um lado em imagem impressa e do outro espaço para endereço, selo e mensagem. Estive aqui? Lembrei-me de você? Carreguei tua saudade comigo nesta estonteante paisagem? Saudades da vovó? Meus primeiros dias longe de casa? A beleza do postal está na universalidade de sua forma, conteúdo sintético e facilidade de linguagem. Na comunicação direta e barata, uma viagem pelo mundo em mosaicos remetidos. A delicadeza no gesto, a espera de quem anseia e a imaginação de quem recebe e ativamente insere a imagem do remetente na paisagem inerte.

Os postais tornaram-se lentos ante os recursos modernos de comunicação instantânea. No mesmo segundo em que se tira uma foto em frente às pirâmides do Egito, chega a imagem ao destino pretendido, o charme da espera substituído pela pressa aflitiva.

Nas visitas às cidades, praças, monumentos e edificações reconhecidas pelo valor histórico e cultural, as fotos dos postais a manter firme a paisagem real. Em tempos de rapidez e velocidades nunca dantes alcançadas, a memória parece não se preocupar em fixar a paisagem. Ao contrário, parece querer superá-la em novas imagens. Mas se os terabytes transitam tão velozmente, não segue a mente, junto, sem perceber o que sente? A paisagem se deforma para caber no fluxo intermitente? Quanta proatividade pode ser comportada no gesto ativo em escolher e enviar o postal. Temo pelo esquecimento dos monumentos e construções significativas, tanto quanto se fez veloz a tecnologia expansiva. Se as imagens procuradas e recolhidas para compor o acervo da memória de um lugar espraiado entre os queridos, agora são esquecidas, haveria espaço na mente para abrigar o gosto por sua preservação?

Sei que os postais são quase símbolo de um hábito perdido, mudança que o aporte em novas tecnologias, silenciosamente, nos roubou da rotina. No entanto, qual novo gesto ativo, permeia em ação a valorização do patrimônio mantido?

 

*Renata é escritora, integrante da Academia de Letras dos Campos Gerais e da Academia Ponta-grossense de Letras e Artes.

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