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Histórias de tempos idos

Antonio Vianna

Como sabemos, as histórias no Estado do Paraná são sempre surrealistas.

Vou contar para vocês a história de um governante do Estado, que em tempos idos foi vítima de sua própria esperteza. Tal governante acabou envolvido em teias de corrupção e de malfeitos éticos e morais que se avizinhavam perigosamente de sua sala de estar.

Quando esse líder político foi à assembleia para falar dos acontecimentos, a impressão que tive, ao ouvi-lo, foi a de que se referia a uma outra realidade, a outra época, a outro Estado, por todos desconhecidos.

Ele falava e eu mal acreditava no que ouvia, especialmente pela maneira desinibida com que afirmava coisas que não faziam qualquer sentido com a realidade que o povo paranaense vivia, com o que diariamente informava a imprensa, com o que sabiam os áulicos ao seu redor e afirmavam os promotores de justiça, estes sim, taxados de loucos.

A única explicação para tal atitude surrealista só pode ser uma firme disposição de aparentar desconhecimento da realidade, de enganar abertamente a opinião pública e de desrespeitar o eleitor, o cidadão, o direito e a democracia. Parecia irreal o discurso de austeridade, de que nunca havia sido pego em malfeitos, quando todos sabiam que acobertava funcionários, no escalão mais alto, que tinham relações incestuosas, do ponto de vista do erário e até com a sogra.

Sucede que, àquela altura de suas aparições públicas, ele ainda não havia atingido o ápice de seu descompromisso com a verdade dos fatos.

Parece-me que o atingiu quando lhe perguntaram se, como governante, tinha alguma relação com um primo distante que fora preso por uma questiúncula qualquer, num pequeno contrato de prestação de serviços para o Estado. Foi taxativo, nada sabia das concorrências fraudadas e de propinas, inclusive, era apenas um parente distante sem qualquer relação de familiaridade ou de proximidade. Dizia-se que naquela época, no Estado do Paraná, a Assembleia era mero balcão de negócios que reproduzia as sinecuras e prebendas distribuídas pelo governante, e tendo essa sempre sólida maioria, reagia a todos os disparates, de maneira a fazer sobreviver às investigações todo político que cumpria com sua parte.

Ele sorriu ironicamente e garantiu que, no seu governo e na sua história política, nunca havia sido acusado da prática de corrupção, mesmo porque a tal corrupção sistêmica, apontada pelos envolvidos no caso nunca acontecera.

Conta-se, na época, que havia se tornado um cínico acabado, aprendiz de outro sujeito que governara o país por quase uma década e que nunca sabia de nada, mais que isso, sempre se sentira traído, mantendo as aparências de uma imaculada moralidade e beatitude, que caem bem aos Santos de Pau-Oco.

Conta-se que à época dos fatos, o tal governante abandonou todos os comparsas à própria sorte, tal qual o seu guru, que era inclusive de partido de oposição, numa demonstração acabada, de como a geleia geral da política brasileira já não fazia qualquer distinção entre situação, oposição ou muito pelo contrário.

Ficamos perplexos pelo que afirmava o tal governante, porque sabíamos que o tal parente distante despachava de um hotel, sobre assuntos de governo, e recebia e filtrava a agenda daquele em seu próprio gabinete.

Conta-se que à época, a população foi à rua e conseguiu com sua pressão travar malfeitos e que ao final e ao cabo, o político teve de renunciar ao seu mandato, exilando-se numa república latino-americana, até que a febre por honestidade e por republicanismo na coisa pública passasse e ele pudesse, tal qual um Collor, retornar aos domínios da política.

O autor é historiador.

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