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O andarilho e o cachorro

 

Naquela grande cidade, o homem acordava cedo com as buzinas ensurdecedoras dos carros logo pela manhã. Seu endereço era qualquer cantinho onde houvesse espaço para ele e para seu cachorro, Bob, que nunca o abandonava.

A rotina do homem era calma. Após levantar, lavava o rosto com a água que guardava consigo em uma garrafa de refrigerante. Dava uma enxaguada na boca, arrumava seus alfarrábios, suas trouxas de roupa e ia preparar seu café da manhã em uma velha e enferrujada lata de doce de pêssego. O Bob latia, lambia seu rosto e aguardava seu querido companheiro para a jornada diária.

Depois, o homem seguia com uma gaiota, recolhendo papelão, papel, latinhas de refrigerantes e tudo que pudesse ser reciclado. Ao final da tarde, ia até o Reciclados Nação Brasileira e vendia tudo que havia juntado. O Bob sempre ao lado da gaiota.

Atrás da gaiota uma placa amarela, daquelas antigas. Também havia a frase “Nunca pergunte o porquê”, escrita com tinta vermelha, que intrigava as pessoas, porém, ninguém ousava perguntar o motivo daquele estranho "conselho".

Uma refeição era garantida. Tratava-se do café da manhã. O almoço às vezes conseguia quando alguém de bom coração ofertava. O homem apertava a campainha das casas ou dos apartamentos e quando alguém aparecia, pedia comida. Não insistia. Vida que segue.

Certa vez, ao chegar numa casa, não percebeu que tratava-se de um seminário de padres. Como sempre fazia, apertou a campainha e aguardou ser atendido. A gaiota estacionada e ao lado o Bob sentado.

Não demorou muito, apareceu uma alma para atendê-los. O homem apresentou-se e apresentou o cachorro. O seminarista que o atendeu achou estranho, visto seu semblante. Ao ver o homem, não o esperou falar, logo voltou. Encontrou outro colega no caminho, que quis saber quem era o sujeito. O seminarista falou:

– É um mendigo. Coitado! Vou pegar um prato de comida para ele.

Voltou com um prato cheio. Arroz, feijão, batata frita, um bife e uns pedacinhos de tomate com pepino. Ao ver o seminarista com o prato, o homem disse:

– Meu senhor, você não trouxe um prato de comida para meu amigo?

– Não! Como assim?

– Então gostaria de esclarecer duas coisas com o senhor: a primeira é que não sou mendigo, pois, tenho casa para morar e não peço esmola. A segunda é que, se não tem comida para meu amigo, eu não aceito sua oferta.

            O seminarista, sem jeito, não sabia o que fazer naquele momento. Apenas observou o homem pegar sua gaiota, assobiar para o Bob, dar meia volta e seguir viagem. O seminarista com o prato na mão apenas observava. A frase na gaiota chamou sua atenção. Deixou o prato no chão e correu ao encontro do homem e do Bob. Perguntou:

– O senhor pode me explicar essa frase em sua gaiota?

– Todo mundo quer saber os motivos de tudo na vida, como se tudo tivesse resposta. Mas a verdade, meu jovem, é que nem tudo na vida tem resposta. Portanto, nunca pergunte o porquê, mas para quê.

O futuro padre, sem palavras e cheio ainda de perguntas em seu íntimo, voltou ao seminário.

O andarilho e seu cachorro seguiram seu caminho.

 

 

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