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Rotina

 

 

De uma hora pra outra o mercado encheu. Estranho porque à tarde geralmente a coisa é bem tranquila. Só dona de casa mesmo e o pessoal da terceira idade. Se bem que esses gostam mesmo é de madrugar no mercado. Nunca vi. Mas de repente lotou. Ainda pro meu azar eu estava no caixa rápido. É o pior. Tem gente que quer passar com mais produtos do que pode. Outros confundem com o preferencial. Não tem empacotador. Ninguém gosta.

            Rapidinho a fila já tinha umas quinze pessoas. E a gente estava em quatro meninas. No começo tudo indo bem. Só gente sozinha. Elas são práticas. Estão ali voltando do trabalho. Querem ir pra casa mais do que eu. É a única vantagem do caixa rápido. Papel higiênico, sabonete e shampoo. Três itens, tá ótimo. Café, trigo, óleo e açúcar. Próximo. Pão, ovo e leite. Botão vermelho duas vezes, por favor. Cerveja, carne e carvão. No cartão? Quero um cigarro.

            Eu detesto quando tenho que buscar cigarro. Quem sempre pega é o empacotador. Mas quando a coisa tá pegando fogo assim, eu mesmo vou lá buscar. Dá até dó dele. Qual marca? Não entendo. Eu não conheço. Como é? Nunca sei se é light ou de menta. Eu não fumo, não conheço as marcas. Deixo o caixa e vou atrás do tal cigarro. O mercado tem mais gente ainda. Tá entrando gente e não tá saindo ninguém. Tá aqui o seu cigarro. Quero box. Fumantes fumam a embalagem também, acho que é isso, qual é a diferença?

            Quando volto de novo, tô só eu no caixa rápido. Pra onde as outras meninas foram eu não sei. A fila tá enorme e o sistema tá lento. Código de barras, código de barras, código de barras. Vinte e sete e cinquenta. Esqueci uma coisinha, volto rapidinho, posso? Antes de eu pensar em dizer não e falar sim, a cliente foi. A cara de impaciência coletiva de quem estava ali atrás dela é instantânea. Vejo meu pai e minha mãe lá no caixa 11. Não, é só a mãe. Toda essa demora por causa de uma Coca-Cola? Reclama o próximo da fila, alto o suficiente pra eu ouvir.

            Tô ficando sem troco. Minha mãe tá lá na fila olhando pra mim ainda. E onde estão as outras meninas do caixa rápido? Próximo. Dá pra passar esse número de cervejas nesse caixa, né? Quantas são? Dezoito. Pode. Se esse sistema lento deixar. Uma cerveja, duas cervejas, três cervejas. Ele começa a sorrir pra mim. Lá do caixa onze minha mãe também. As outras meninas do caixa rápido voltaram. Também riem. Do quê? Sete, oito, nove cervejas. Não é mais fácil multiplicar por dezoito, moça? Claro, é assim que se faz. Doze, treze, quatorze. O bipe da leitora vai aumentando junto com a gargalhada de todo mundo. Minha mãe sumiu da fila. Quinze, dezesseis, dezessete e dezoito. Pronto. Esquece, não quero mais levar nada. Como assim? As gargalhadas vão diminuindo e o bipe fica  cada vez mais alto.

            Acordo assustada. No celular são quinze pras sete. É segunda-feira.

 

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